ENTREVISTA: Tony Kakko fala sobre álbum acústico do Sonata Arctica e rechaça os antivacina


A fama de baladeira sempre perseguiu o Sonata Arctica. À luz dos 25 anos da banda, o vocalista Tony Kakko parece lidar bem com isso, amparado na certeza de que músicas como “Tallulah” são apenas parte de um todo muito mais amplo e que muitas vezes vai na contramão do que esperam e desejam os fãs do power metal. A mais recente empreitada dos finlandeses é o volume 1 de “Acoustic Adventures”, que inclui releituras em formato acústico de grandes sucessos da carreira. Na véspera do lançamento, pude conversar com Tony a respeito disso e de muito mais. Boa leitura!


Transcrição: João Marcello Calil

Fotos: Facebook.com/sonataarctica


Marcelo Vieira: Vocês vêm amadurecendo a ideia de gravar um álbum acústico há algum tempo. Podemos dizer que a pandemia – e, junto com ela, a impossibilidade de fazer shows – meio que acelerou o processo?

Tony Kakko: Na verdade, não. Fizemos tudo antes da pandemia. Já tínhamos até reservado os estúdios. A coisa toda estava meio que iniciada e decidida já em 2019, quando da nossa Acoustic Adventures Tour pela Europa e os caras da gravadora puderam ver os shows e concordaram que devíamos gravar essas versões [acústicas] e lançá-las. [Risos.] Gravamos os dois volumes no final do ano de 2020. A ideia original era lançar furtivamente o primeiro volume em janeiro, exatamente um ano atrás, mas adiamos por um ano em razão da pandemia e da dificuldade que seria para divulgar o álbum. Quem diria que agora a situação é exatamente a mesma?! [Risos.] Continuamos sem poder fazer uma turnê, mas temos que lançar logo isso porque dentro de um ano temos que começar a trabalhar no próximo álbum de inéditas do Sonata Arctica.


MV: Das doze músicas do repertório desse volume 1, dez já haviam sido executadas em formato acústico durante a Acoustic Adventures Tour. Os arranjos foram mantidos ou vocês adicionaram algo às músicas?

TK: Uma coisa ou outra; aquelas que sentimos que não funcionaram bem ao vivo. 


MV: Na turnê vocês tocaram 21 músicas diferentes nos 29 shows. As outras onze músicas testadas e aprovadas estarão no Volume 2?

TK: Com certeza. O Volume 2 vai ter 12 músicas, a menos que eu tenha contado errado! [Risos.] Como vocês podem notar, não incluímos nenhuma música do “Ecliptica” (1999), nosso álbum de estreia, no Volume 1, e isso foi uma falha grave; total falta de atenção. A ideia era que os dois volumes fossem o mais equilibrados entre si possível. Não queríamos fazer um volume com as músicas rápidas e outro com as lentas, por exemplo, mas sim dois álbuns que funcionem bem sozinhos, como são, e representem bem a ideia dessas “aventuras acústicas”. Portanto, o próximo volume vai ter músicas do “Ecliptica”.


MV: Embora o número de baladas e músicas mais cadenciadas lhes permitisse escolher o caminho mais fácil, ainda assim vocês optaram por adaptar músicas como “Wolf and Raven” para o formato acústico. Quão desafiador foi fazer essas adaptações?

TK: Foi bem tranquilo, porque no centro de todas essas músicas há melodias sólidas e essas músicas funcionam mesmo se você as toca no violão. Quando você despe a música de todos os adereços, a melodia é o que resta, e você pode adaptá-la da maneira que quiser. Qualquer música mais lenta pode facilmente ser transformada em uma música rápida e, se você tiver uma boa melodia, pode pegar uma música rápida e transformá-la em uma balada. A letra não necessariamente acompanha essa ideia, mas, às vezes calha que sim.



MV: Há uma preocupação em não descaracterizar a música ou a ideia ou às favas com tudo isso e bora subverter completamente a estrutura original?

TK: Deixamos as músicas ditarem a maneira como seriam tocadas acusticamente. “Wolf and Raven” é uma que tocamos surpreendentemente parecido com a versão original, e ficou muito engraçado; o violão é totalmente diferente da guitarra, sem contar os teclados e o piano, então foi um desafio fazer com que esses elementos funcionassem em conjunto, porque essa música em especial tem um uníssono muito rápido que precisa ser sólido, e isso foi um pouco desafiador. Em situações ao vivo é muito divertido tocá-la; é uma música divertida de tocar e ninguém a leva tão a sério, então é meio que uma síntese de toda a coisa do “Acoustic Adventures”: suavidade, descontração e relaxamento.


MV: Você gostou mais de alguma das músicas revisitadas em formato acústico do que da original?

TK: Sim. “The Rest of the Sun Belongs to Me” e “For the Sake of Revenge”. Gostei mais das versões acústicas do que das originais. Deve haver outras, mas essas são as que me vêm à mente agora.



MV: No documentário que antecede o MTV Unplugged do KISS, Paul Stanley diz que o formato acústico é o teste final de uma música; se a música não fica boa no violão, ela não presta. Até que ponto você concorda com ele?

TK: Concordo cem por cento com ele. Se bem que há músicas que foram originalmente escritas de uma maneira totalmente diferente. Você conhece “Sandstorm”, do Darude? Acho uma ótima música, mas não tenho certeza se funcionaria bem no formato acústico! [Risos.]. Então, para toda regra há uma exceção, mas concordo com ele de qualquer maneira.


MV: Seu processo de composição passa por você com o violão no colo em algum momento? Quero dizer, as músicas se originam de maneira acústica ou quando devem ser pesadas, você já as traz à vida na guitarra?

TK: Costumo compor mais usando teclados. Piano, teclados, sintetizadores e afins. Mas toco violão também, então acho que para um compositor, especialmente se você estiver usando instrumentos para compor sua música, é saudável ter dois instrumentos diferentes para tocar. Não sou um grande violonista, mas consigo arranhar uns acordes e tocar o básico para compor uma música. Às vezes, quando você tem apenas um instrumento, é muito fácil ficar preso a ele, e a única maneira de sair disso às vezes é pegar um totalmente diferente, como um ukulele, por exemplo [Risos.] Mas, sim, uso muito o violão para compor também.


MV: Já que mencionei o MTV Unplugged, o rock e o metal têm várias performances acústicas memoráveis. Quais são as suas favoritas?

TK: Acho que um dos pontos de partida para mim quando comecei a pensar sobre que tipo de versão das músicas do Sonata Arctica faríamos foi “Layla”, do Eric Clapton. A versão acústica dela é linda, maravilhosa. Na minha opinião, é melhor do que a versão original, mais pesada. Era esse o tom que eu queria dar às músicas do Sonata.



MV: A música mais ouvida do Sonata Arctica nas plataformas digitais é “Tallulah”. Uma vez li que “Tallulah” é a sua “More Than Words”. Dado o quão estigmatizado o Extreme foi devido ao sucesso de “More Than Words”, você considera essa comparação boa ou ruim?

TK: Acho que boa, porque sei que não somos só “Tallulah”. [Risos.] Acho até que temos músicas muito mais conhecidas. Algumas pessoas quando pensam no Sonata Arctica, pensam logo em “Wolf and Raven”, por exemplo. Mas, definitivamente, “Tallulah” atrai um número maior de pessoas, mesmo fora do nicho do metal. Na Finlândia, chamou muita atenção de todos; em algum momento foi uma das músicas recordistas em karaokês. Não tenho ideia de quantas centenas de versões diferentes de “Tallulah” já ouvi! [Risos.] Isso significa muito para mim; é uma espécie de testemunho de que a música realmente funciona e de que você tocou a vida das pessoas. Se daqui a cem anos, “Tallulah” for a única música pela qual seremos lembrados, tudo bem. 


MV: Existe uma receita para a balada perfeita?

TK: Você precisa ter uma bela melodia e uma boa letra. Fora isso, pode fazer praticamente qualquer coisa. Se conseguir tocar as almas das pessoas, e se encontrar uma maneira para que a música encontre um significado em cada uma delas, essa é a chave.



MV: Ainda é possível – embora correndo o risco de irritar os fãs, que são super apaixonados e mente fechada – inovar no power metal?

TK: Acho que temos feito isso a cada álbum. [Risos.] Nunca seremos uma típica banda de power metal. Já ouvi muita merda sobre isso. Desde o começo, as pessoas tentavam me dizer sobre o quê cantar, mas, veja só, 25 anos depois, ainda estou aqui cantando sobre o que me dá na telha!


MV: Mas você sente que os fãs estão sempre pedindo a mesma coisa?

TK: Sinto. Mas alguns apreciam a mudança e mudar permite que você conquiste novos fãs. Nosso segundo álbum [“Silence” (2001)] já é um pouco diferente do primeiro. Basta isso para que as pessoas comecem a ter opiniões e nem sempre lhe dirão algo positivo. Seguir a fórmula à risca, igual ao AC/DC, por exemplo, é muito mais seguro. [Risos.] Mas ao tomar o caminho da segurança, os seus resultados são sempre os mesmos.


MV: Dito isso, você tem um projeto musical “diferentão” que gostaria de tirar do papel? 

TK: Sim. Tenho trabalhado em coisas paralelas por um bom tempo. Vamos ver quando sai. Está sendo feito há, tipo, 20 anos ou algo assim! [Risos.] Mas finalmente está ganhando contornos reais.


MV: Poderia dar mais detalhes?

TK: Não é nada fora do mundo do rock, mas está me permitindo usar muitas das músicas que não consigo aproveitar no Sonata Arctica.



MV: O Sonata veio ao Brasil seis vezes e fez um total de 44 shows aqui. É um número impressionante. Que lembranças você guarda de suas experiências no Brasil?

TK: Pessoas maravilhosas, clima quente, comida boa... Churrascarias... [Risos.] Boas bebidas e belas paisagens. Sempre foi muito, muito bom ir ao Brasil. O único problema é que não consigo entender nada do que vocês dizem! [Risos.] Português é um idioma difícil demais! [Risos.]


MV: Em abril vocês tocam por aqui. Existe alguma possibilidade de retornarem com essa turnê acústica?

TK: Eu adoraria, mas não tenho certeza. Em tempos de covid-19, você precisa ter muito cuidado com seus planos. Tem um ditado que diz “Se você quiser fazer Deus rir, conte a Ele os seus planos”. É bem por aí, então é melhor não fazer nenhum plano agora! [Risos.]


MV: Você já tomou a vacina?

TK: Tomei duas doses até agora. É obrigatório; ou você toma ou não pode entrar em vários países, e isso torna a vida impossível para um músico em turnê. Independentemente disso, sou totalmente pró-vacina. Se não houvesse vacinas, eu provavelmente teria morrido de alguma coisa.


MV: Eu gostaria que mais pessoas pensassem como você.

TK: Eu também. Todo mundo agora é metido a especialista e se acha o dono da verdade, e esse é o maior e mais lamentável problema que temos hoje em dia.



Saiba mais sobre o Sonata Arctica:

Site oficial | Facebook | Twitter | Instagram | YouTube


Comentários