ENTREVISTA: “Quem tem cena é filme!”, detona Humberto Zambrin (Attractha)

 


A série de entrevistas com bandas autorais brasileiras ganha um novo capítulo. Com o guitarrista Ricardo Oliveira, o baterista Humberto Zambrin formou o Attractha em 2007 na cidade de São Paulo. Numa história comum aos que batalham no underground, o grupo demorou a estabelecer uma formação e a estar apto a correr atrás de seu espaço. Mas depois que o fez — sobretudo após a entrada do vocalista Cleber Krichinak, recrutado junto ao tributo ao Manowar de nome Kings of Steel —, foi como se os planetas milagrosamente se alinhassem, tudo começou a caminhar, a passos tímidos, porém firmes. 


Com discografia até o momento composta pelo EP “Engraved” (2013), o single “Unmasked Files” (2015) e, finalmente, o álbum “No Fear to Face What’s Buried Inside You” (2016), o Attractha promete inúmeras novidades e dedicação total para 2023. No bate-papo a seguir, Humberto ainda teceu comentários sobre a cena — que cena? — metal nacional, compartilhou as dificuldades de se fazer som autoral no Brasil e meteu a real ao dizer o que todos nós pensamos: “Não dá pra concorrer com uma banda que coloca ambulâncias em shows em troca de espaço para tocar”.


Boa leitura!


Fotos: Edu Firmo (banda) e Punany Fotografia (Humberto) / Divulgação


O Attractha tomou forma em 2007 com a premissa de “produzir uma música livre de rótulos dentro do Metal, da forma mais eclética dentro das influências de cada um dos músicos”. Vocês poderiam explicar isso um pouco mais a fundo? Tipo, quais são as principais influências musicais que moldaram o som da banda no começo e quais outras foram surgindo pelo caminho?

Quando eu conheci o Ricardo, tivemos uma conexão musical muito boa, mas era notório que tínhamos influências muito distintas. Ele era um guitarrista muito voltado para as coisas de guitarristas mesmo; ouvia muito Mr. Big, Dream Theater e tinha uma forte escola de Hard Rock. Eu já tinha passado por isso e estava muito mais focado em sons mais pesados; afinal, Thrash Metal sempre foi minha maior paixão. Na época, eu acreditava que essa mistura de influências poderia ser muito boa pra banda; afinal, não iríamos definir um estilo, seguiríamos por onde nossa musicalidade nos levasse. E realmente funcionou e funciona até hoje. 

No começo, o som estava muito mais calcado no Hard Rock, pois as composições eram 100% do Ricardo. Ao longo dos anos, fui apresentando outras bandas e sonoridades a ele. Ele foi absorvendo esse novo universo musical e nosso som foi ficando naturalmente mais pesado e amplo. Depois da entrada dos novos músicos, como o Guilherme [Momesso, baixista] e o Cleber, isso só aumentou, pois todos trazem mais influências agora, e acabamos tendo um universo musical muito mais amplo para nos inspirar. Hoje, além do Hard Rock, há nítidas influências de Thrash, Death, Metalcore; enfim, nossas cabeças são muito abertas em relação a música e ao Metal em si. O lema é: “Se ficou bom, fica na música!”


A banda penou até conseguir se estabelecer, chegando até a jogar a toalha após um período de constantes mudanças de vocalista. Faltou nesses caras mais comprometimento ou mais identidade musical/sintonia com o som da banda?

No começo, era tudo muito difícil porque não tínhamos nada. Como banda, tínhamos as músicas, mas não havia nada gravado, nada lançado e existia muito trabalho a ser feito. Das pessoas que passaram pela banda nessa época, dos que me lembro, é meio que um mix disso tudo. Alguns queriam algo mais pronto, não queriam trabalhar do zero. Alguns desanimavam no meio do caminho, pois tinham que construir tudo com a gente e nem sempre tinham energia ou tempo pra isso, e alguns tinham tudo isso, mas não tinham a musicalidade ou o nível musical necessário. 

Também posso citar que ficamos algum tempo com pessoas em relações mais tóxicas... Pessoas meio autossabotadoras que simplesmente não conseguiam ou não queriam que as coisas dentro da banda andassem. Todo momento que tínhamos que dar um passo à frente, acontecia de ter um pouco dessa autossabotagem e perdíamos o timing e voltávamos atrás... Não sei se consigo explicar isso bem, mas é como se um ou alguns membros da época não quisessem que a banda fosse pra frente. Tanto que, após a saída dessas pessoas, a banda aconteceu muito rápido... Enfim, coisas bizarras que acontecem em relacionamentos interpessoais.


Na época do EP “Engraved”, a banda sentiu o gosto de ter sua música tocada, seu trabalho reconhecido nacional e internacionalmente. Ainda assim sofreram baixas. De onde veio a força para se manter de pé?

A força veio exatamente daí: de ver seu trabalho girando e sendo reconhecido. Estávamos bem no começo e, como disse anteriormente, quando conseguimos colocar a banda pra andar, tudo foi rápido. Havia muita energia na gente e muita vontade de fazer a banda acontecer, então foi relativamente fácil fazer a banda continuar dali, pois estava indo tudo muito bem.



O álbum “No Fear to Face What’s Buried Inside You” foi produzido pelo Edu Falaschi e teve lançamento físico pela Shinigami Records. Fala um pouquinho sobre o Edu e o selo; o trabalho com ambos, se rolou algum aprendizado, enfim...

Com certeza rolaram muitos aprendizados! Em todos os sentidos! [Risos.] Zoeiras à parte, certamente trabalhar próximo de profissionais que conhecem mais do que você do mercado sempre é uma forma de aprender muito.

Com a Shinigami, nosso acordo foi de distribuição, então não tivemos muita interação. Quando tivemos o material em mãos, fizemos uma reunião, acordamos os termos da distribuição do álbum, o que caberia a cada parte etc., e foi basicamente isso. Como foi nosso primeiro acordo de distribuição, obviamente entendemos todo o processo logístico da gravadora para então concordar com os termos e assinar o contrato.

Já com o Edu, daria pra escrever um livro aqui... Resumidamente, ele nos ajudou muito na pré-produção, nos ensinando alguns truques e boas práticas de composição, mexendo nas estruturas das músicas, compondo novas partes, tirando outras; enfim, foi uma grande aula de composição com uma pessoa que considero um dos melhores compositores de Metal no Brasil.


Chegamos a 2023. O que mudou no front do Attractha? E o que mudou na maneira como vocês encaram ter uma banda e fazer música? O quanto a música de vocês reflete os valores enraizados e suas visões de mundo?

No front tudo mudou, porque aqueles caras lá de 2016, 2017, 2018 e 2019 não estão mais aí... Somos outras pessoas hoje, mais velhos, mais maduros, num pós-pandemia, onde isso teve diferentes impactos sobre cada um. É como começar uma nova banda, com caras mais exigentes e mais experientes também. Nessa nova etapa, creio que estamos mais pé no chão com muitas coisas, menos sonhadores, mas tudo está sendo feito com muito mais profissionalismo do que no passado. Somos uma nova versão de nós mesmos e a banda também...

Com relação a valores, creio que nossa visão está toda no álbum anterior, cujo título já diz tudo: “No Fear to Face What’s Buried Inside You”. Tudo o que está escrito lá reflete nossas opiniões, valores, sentimentos e atitudes.



Como você vê a cena do Heavy Metal no Brasil e como o Attractha se encaixa nessa cena?

Não existe cena... quem tem cena é filme! Cena pressupõe que tudo envolvido com Metal seria mais unido, giraria em torno de algo comum e até autossustentável e isso não é verdade. Vemos o Metal no Brasil como um mercado, onde há muito o que amadurecer para se equiparar aos mercados de outros países. Hoje, o Metal no Brasil está profissionalizado para muitos poucos e continua sendo underground e amador para a grande maioria. A maior parte das bandas não tem onde tocar, acham que bares são suas únicas oportunidades de se apresentar, autorais insistem em disputar espaço com bandas cover e as oportunidades de venda e crescimento, por serem nichadas, são extremamente limitadas. 

Dentro desse cenário, temos convicção que hoje o Attractha não tem muito espaço para crescer e, para despontarmos de alguma forma, temos que fazer um trabalho muito duro, muito caro e certamente sem retorno financeiro imediato. Então, como eu disse antes, fazemos tudo com o maior profissionalismo possível, mas mantemos esses investimentos, principalmente os financeiros, dentro de limites de realidade que nossa experiência nos permite enxergar. É duro, mas essa é a verdade...


Quais são os principais desafios que as bandas de Heavy Metal enfrentam no Brasil, em termos de produção, distribuição e divulgação de música?

Bom, pensando em bandas de Metal autoral, o principal desafio é o investimento financeiro. Uma banda tem que entender que não basta só gastar para gravar... tem que investir dinheiro em produção musical, em produção de shows, em distribuição de conteúdo, sejam clipes, seja musical, investir em divulgação que significa assessoria de imprensa, booking, gerenciamento da banda em si... Sempre digo que pra cada real que você investe em gravação da sua música, outros cinco têm que ser investidos nesses outros pontos, pois não adianta ter o melhor álbum gravado e ninguém conhecer. E achar que seus amigos vão compartilhar seu trabalho é ilusão. Por mais engajamento que tenha, perto do mercado nacional de Metal, isso sempre será pouco!

Fora isso, um grande desafio é despertar o interesse do público. Estamos vivendo um tempo de revival musical, onde as bandas antigas continuam ativas e fazendo mais e mais shows de aniversários de álbuns e turnês de despedida. O público do Brasil acaba sendo consumido por essas oportunidades de ver grandes shows e acabam não tendo dinheiro, agenda e nem tempo para se dedicar às músicas novas... Certamente isso vai mudar, mas as bandas que estão aqui agora não vão durar para ver isso.



Como vocês lidam com a concorrência dentro da cena do Heavy Metal no Brasil e como vocês procuram se destacar? O que acreditam serem os “pontos fortes” do som de vocês em comparação com o som de outras bandas?

Não acredito em concorrência ou pontos fortes musicais. Isso é gosto. Se uma pessoa ouve e gosta, gosta e ponto final. Me nego a sentar no meu instrumento e pensar em fazer uma música melhor que banda A ou banda B; isso é incoerente pra mim. Assim como achar que minha música é melhor ou pior do que a de outras bandas. Essa é a minha música, ela é única. Por isso não acredito em concursos de bandas autorais, porque não há parâmetro de comparação. Concurso de covers é ok, você analisa o quão fiel é o cover à versão original, mas como você vai comparar a arte que sai dos sentimentos de cada pessoa? Isso não existe. Nos concursos ou comparações assim vence o gosto da maioria, saca? Quem é melhor, o Bon Jovi ou o Death? Dá pra entender?

Agora, no quesito divulgação, aí sim existe concorrência, pois quem investe mais terá mais espaço, simples assim. Nesse ponto, nós sempre nos planejamos. Temos nosso plano e seguimos nosso plano dentro das nossas condições. O que dá pra fazer, fazemos; o que não dá, não dá e ponto-final. Não dá pra concorrer com uma banda que coloca ambulâncias em shows em troca de espaço para tocar, pois não temos como pagar ambulâncias e médicos. Nesse caso o lance é: você tem que ver onde pode investir, como e quando. Com um plano feito, você busca suas oportunidades sabendo que não vai ganhar todas. 


Quais são as principais diferenças entre o Heavy Metal produzido no Brasil e aquele oriundo de outros países? O que o músico brasileiro tem que os outros não têm?

Na minha opinião, atualmente cada país no mundo tem seus próprios estilos de Heavy Metal. Acho que o tempo em que tudo soava meio parecido se foi. O Metal Nórdico tem suas características, assim como o norte-americano e assim vai. Então o Brasil também tem seu lugar. Temos muitas bandas aqui que soam autênticas e que buscam sua própria sonoridade. Vivemos um tempo muito rico para quem quer explorar as possibilidades musicais do Metal. Tudo está a um click em nossos celulares, basta procurar. 

Da mesma forma, o músico brasileiro não é inferior ao gringo, nem superior, temos nossas qualidades em ponto de igualdade, fora os talentos individuais, que não são comparáveis. Obviamente falando dos que se profissionalizam, excluindo-se hobistas e amadores, certo? Já temos muitos músicos brasileiros no Metal mundial. Caras que eram famosos aqui e outros que não, conquistaram seus lugares no mercado mundial com seu trabalho. Alguns até desistiram e voltaram, pois a realidade é muito mais dura que as fantasias de garoto nos permitiam ver. Mas estamos aí, em pé de igualdade. Como disse, não vejo superioridade nem inferioridade, a questão é profissionalismo, competência, dedicação e muito esforço.


O que o Attractha planeja alcançar nessa nova fase e o que vocês podem antecipar em relação ao que está por vir em 2023?

A nossa meta é alcançar mais pessoas, distribuir melhor nossa música com novos lançamentos e, estando mais bem preparados, conquistar mais espaço no mercado nacional. 2023 vai ser um ano de muitos lançamentos, novo álbum, novos shows, quem sabe superar os números de shows e cidades onde tocamos na tour passada, enfim, crescer. Pra isso acontecer, teremos muitas surpresas e lançamentos muito diferentes do que está aí no mercado! Preparem-se!



Saiba mais em:

Facebook: www.facebook.com/attractha 

Twitter: www.twitter.com/attractha 

Instagram: www.instagram.com/attractha

E-mail: contato@attractha.com


Comentários