ENTREVISTA: David Vincent (I Am Morbid) exalta os pesos-pesados de ontem e critica a falta de diversidade no death metal de hoje

 


A carreira de David Vincent abrange décadas, mas o reconhecimento veio principalmente por seus trabalhos como vocalista e baixista do Morbid Angel (1986-1996, 2004-2015), uma das mais influentes bandas de death metal da história. 

Desde 2016, o músico norte-americano lidera o I Am Morbid, que está prestes a desembarcar no Brasil para uma turnê em comemoração aos trinta anos do álbum “Covenant” (1993), de seu antigo grupo, um clássico fundamental para o gênero. 

Pude conversar, mesmo que rapidinho, com Vincent sobre isso e um pouco mais.

Boa leitura!


Por Marcelo Vieira

Transcrição: Beatriz Cardoso

Foto: Felix Boy / Divulgação


Marcelo Vieira: É verdade que vocês estão ensaiando até de madrugada?

David Vincent: É. Nós ensaiamos bastante. Toda vez que subo ao palco, quero estar preparado. Eu me importo com a qualidade, todos nós nos importamos. Então, sim, estou aqui na Flórida ensaiando até de madrugada. É isso que fazemos: toda vez que vamos para a estrada, temos pelo menos uma semana de ensaios.


MV: Para aqueles que ainda não tiveram a oportunidade de ver o I Am Morbid ao vivo, como você descreveria a experiência de um show da banda e o que os fãs podem esperar?

DV: Shows precisam ser coesos, apaixonados, orgânicos e sinceros. E é exatamente isso que o show do I Am Morbid é.


MV: Quais são as principais diferenças entre fazer parte de uma banda como o Morbid Angel e do I Am Morbid?

DV: Não muda muito. No I Am Morbid, estamos tocando os clássicos do Morbid Angel dos álbuns dos quais eu fiz parte. Só que tem um diferencial: todos se dão muito bem. E isso é fundamental quando pintam alguns dos desafios que podem ocorrer na estrada em termos de programação e nos aeroportos. Às vezes o equipamento não está funcionando direito ou somos obrigados a dormir pouco para cumprir o cronograma. Mas temos uma parceria forte, e não permitimos que os percalços atrapalhem o fato de que somos todos bons amigos e nos damos bem. E isso é uma coisa boa. Isso é uma coisa muito boa.


MV: Como é trabalhar com o brasileiro Bill Hudson, especificamente? 

DV: Bill é um guitarrista fenomenal. Ele tem sido meu braço direito desde o início. E eu gosto dele como pessoa. Considero-o um amigo muito próximo e até um irmão. Gosto de tocar com ele. Ele é divertido e, como eu disse, é um baita músico. Se esforçou muito para isso. É essa qualidade técnica que quero demonstrar com esta banda.


MV: E em relação ao Brasil, o que você mais gosta?

DV: Caramba, há tantas coisas de que gosto. Para começar, a comida. A comida é incrível. E os fãs. E a cultura. O Brasil é muito diferente dos Estados Unidos, mas é reconfortante e, ao longo dos anos, tive a sorte de fazer muitos amigos e conquistar muitos fãs no Brasil. E esta é a razão pela qual estamos de volta: pelos fãs. É por isso que é tão importante para mim estar bem ensaiado e cuidar da saúde e dormir o suficiente para que eu possa subir ao palco e dar o meu melhor, com a mesma paixão que sempre tive ao longo de toda a minha carreira.



MV: O Morbid Angel foi uma das bandas pioneiras do death metal. Como você vê a evolução do gênero desde o início da banda até os dias de hoje?

DV: Quando começamos, não havia o que hoje chamamos de death metal. Na época, havia o Death, o Possessed, o Repulsion; eram poucas bandas, mas todas tinham sons diferentes. Cada uma tinha seu próprio estilo. Tocamos um gênero de música semelhante, por assim dizer, mas Morbid Angel e Obituary têm um som completamente diferente uma da outra. Todas as bandas que estavam surgindo na mesma época que nós tinham um som único. Hoje em dia, há muitas bandas que soam de forma semelhante; abordagem semelhante, estilo semelhante, timbre de guitarra semelhante. Embora haja muito mais bandas hoje, acho que não há tanta diversidade quanto havia antigamente.


MV: O que você acha que torna um álbum como o “Covenant”, que vocês estão tocando na íntegra na atual turnê, tão duradouro e importante dentro do gênero?

DV: Essa é uma pergunta muito boa e eu também já me fiz essa pergunta. Não sei se há 30, 40 anos, eu teria pensado nisso. Eu não estava [fazendo álbuns] pensando no futuro. Estava apenas vivendo no presente; escrevendo, gravando, tocando. É realmente incrível ver que, muitos anos depois, essas músicas que criamos ainda sejam tão importantes para as pessoas. São importantes para mim, lógico, porque faço parte disso, são a minha expressão artística, mas sou muito grato que essas músicas tenham resistido ao teste do tempo.


MV: Citei o “Covenant”, mas talvez o álbum mais icônico da discografia do Morbid Angel ainda seja o “Altars of Madness” (1989). Você poderia compartilhar algumas memórias ou insights sobre a criação desse álbum e o impacto que teve na cena musical na época de seu lançamento?

DV: Como banda, sempre fomos bastante introvertidos, e o que quero dizer com isso é que ensaiávamos muito; estávamos sempre tocando, sempre juntos e preocupados com o que estávamos fazendo. Não estávamos realmente preocupados com o que os outros estavam fazendo. Portanto, não é como se ouvíssemos alguma outra banda e a usássemos como um exemplo para como faríamos as coisas. Olhávamos internamente, porque não havia nada mais para olhar além de nós mesmos. Sempre fizemos isso. Havia outras bandas de que gostávamos, mas não corríamos atrás de soar como elas, nem queríamos. Soávamos como nós. E pensando em como as coisas eram no passado, tivemos a sorte de ir para o Brasil bem cedo. Quero dizer, acho que foi por volta dessa época, mas fizemos algumas boas turnês por aí. E isso nos deu a oportunidade de nos conectar com os fãs bem no comecinho. Mais uma vez, sou muito grato. Nossos fãs são incríveis. Existem fãs de outros tipos de música que, na minha opinião, não apoiam as bandas tanto quanto os fãs de música extrema. Os fãs de metal extremo são leais. Leais ao extremo.


Vincent, Hudson e o baterista Pete Sandoval.

MV: Quando você pensa em todos os álbuns que gravou, qual deles considera o melhor exemplo ou a melhor introdução à sua arte?

DV: Essa é uma pergunta difícil de responder porque eles não são todos iguais. Meus favoritos mudam de um dia para o outro ou dependendo do meu humor. Mas amo cada um deles igualmente pelo que são. E cada um deles basicamente captura o momento no tempo em que estávamos naquele ponto. Imagino que, se fosse gravar o “Altars of Madness” hoje, soaria completamente diferente do que soa. Portanto, é um registro histórico; tal coisa aconteceu naquela época e aqui está o disco como prova. Sempre que lanço outro álbum, ele meio que resume o contexto histórico em que foi feito, e continuo fazendo isso. E nosso fãs ainda quererem ouvir essas músicas é uma vitória e tanto.


MV: Qual o segredo para manter inabalável a paixão por criar música?

DV: Não diria que é um segredo; está mais para uma assombração. A música está na minha cabeça 24 horas por dia. Não consigo desligá-la. A inspiração simplesmente vem para mim e nos momentos mais estranhos, tipo quando estou lavando o carro ou fazendo qualquer tarefa diária. Portanto, a música é apenas parte do que sou como pessoa. É isso. Tudo se resume à música.


MV: Para encerrarmos, gostaria que você recomendasse uma banda. 

DV: I Am Morbid, é claro. Qual outra você acha que eu recomendaria? [Risos.]



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