ENTREVISTA: Uma conversa com Dean Roberts sobre “Kill the Hunted”, o novo álbum do Leatherwolf

 


Outrora apelidado “Drum Machine”, Dean Roberts foi fundador e o único membro remanescente da formação original do Leatherwolf. O foco da conversa que você está prestes a ler é o tão aguardado álbum “Kill the Hunted”, recentemente disponibilizado em CD no Brasil pela Hellion Records, que marcou o retorno da icônica banda americana após 16 anos sem lançamentos. Dean compartilha insights sobre a trajetória do grupo, desde os dias de suavização sonora em prol do êxito comercial até os desafios contemporâneos enfrentados por bandas da estatura do Leatherwolf, incluindo as constantes mudanças na formação e a luta para manter a identidade intacta e preservar a confiança dos fãs. Em uma análise franca sobre a realidade da indústria musical atual, Roberts explora como o Leatherwolf se posiciona nesse cenário digital, onde os músicos muitas vezes precisam equilibrar a paixão pela música com empregos regulares. 

Boa leitura!


Por Marcelo Vieira

Transcrição: Beatriz Cardoso

Fotos: facebook.com/leatherwolfmetal


Marcelo Vieira: No ano passado, o Leatherwolf lançou seu sexto álbum de estúdio, intitulado "Kill the Hunted". Vamos iniciar discutindo sobre esse trabalho. Como você descreveria o álbum em termos de sonoridade e conceito?

Dean Roberts: Bem, eu simplesmente adoro esse álbum. Aprecio todos os músicos que contribuíram para ele, o modo como foi mixado e o resultado final. Gosto da estética sonora que alcançamos. Na minha opinião, ele emana uma vibe verdadeiramente metal, com força, robustez, e não há uma faixa mais lenta para diminuir o ritmo. É um conjunto coeso...


MV: Sem dúvida, sinto que o Leatherwolf explorou novas direções musicais neste álbum. Notam-se muitas passagens instrumentais, solos extensos e virtuosos, e, como você mencionou anteriormente, uma certa inclinação para o progressivo.

DR: Contamos com Rob Math, um guitarrista fenomenal. George Lynch fez uma participação, assim como Joel Hoekstra. Barry Sparks, um dos melhores baixistas do mundo, também integra o time. Luke Man, um jovem guitarrista muito talentoso, está presente. Keith Adamiak é um vocalista competente, com um timbre único e uma abordagem mais agressiva, o que eu aprecio. É mais a minha vibe de Leatherwolf. Se eu tiver que escolher, meu álbum favorito provavelmente seria o primeiro ["Leatherwolf" (1985)], porque é essencialmente puro heavy metal.


MV: Como foi o processo de composição e gravação deste álbum em comparação com os trabalhos anteriores da banda?

DV: Houve menos colaboradores envolvidos. Geoff Gayer, nosso ex-guitarrista, foi responsável por muitos dos riffs e arranjos, enquanto Robbie e eu cuidamos das bases de guitarra. Dedicamos um tempo significativo à busca pela vibração ideal, concentrando-nos em criar guitarras impactantes. Nos primeiros álbuns, meu envolvimento nesse aspecto era limitado, já que Carey Howe, Geoff e Mike Olivieri praticamente tocavam tudo, e meu papel se resumia a escrever minhas partes e oferecer algumas opiniões pontuais. No entanto, neste trabalho, a dinâmica foi totalmente diferente, pois eu peguei as músicas e as transformei de acordo com minha visão do que deveriam ser.


MV: As principais influências musicais da banda permanecem consistentes desde o início, ou ao longo dos anos houve a incorporação, mesmo que de forma parcimoniosa, de novos estilos ao som do grupo?

DR: A abordagem tem sido a mesma em todos os discos que fiz. Nunca fui influenciado pelo que estava em voga na época. A única exceção talvez seja "Road Rage"; essa música foi escrita nos anos 1980, e decidi adicionar um toque punk a ela, um ritmo mais animado e um toque mais thrash. Então, essa pode ter sido a única instância em que incorporei uma influência contemporânea, neste caso, um pouco do thrash metal atual.



MV: E em relação aos temas líricos abordados em "Kill The Hunted", o que você pode compartilhar?

DR: É sempre uma jornada pessoal. Contamos histórias sobre nossas experiências, você sabe? Acredito que este álbum reforça isso, pois eu e o vocalista compartilhamos uma visão semelhante sobre o que gostamos de abordar nas letras. Ele escreve letras impactantes sobre desafios e soluções. Eu aprecio esse aspecto de contar uma história.


MV: "Kill the Hunted" marca essencialmente a estreia de todos os outros membros, exceto você e o Geoff, na banda. Talvez o mais reconhecido entre eles seja Barry Sparks, que já colaborou com diversos grupos. Pode nos falar um pouco sobre a formação atual da banda? Por que esses músicos são os mais adequados para dar continuidade à trajetória do Leatherwolf?

DR: Porque todos são músicos excepcionais! Além disso, todos conseguem tocar em mi (afinação padrão). À medida que os vocalistas envelhecem, eles tendem a perder alcance vocal, o que leva algumas bandas a afinar os instrumentos para tons mais baixos. Contudo, ao fazer isso, as músicas perdem um pouco de seu brilho. Além do mais, o fato de serem mais jovens sugere que só vão aprimorar suas habilidades com o tempo. Acredito que temos talento de sobra para elevar a qualidade da interpretação musical com esses músicos.


MV: Já que abordamos o tópico da formação, o Leatherwolf teve várias mudanças de vocalistas na última década. Para os observadores externos, essas alterações sugerem uma certa instabilidade dentro da banda. Poderia compartilhar um pouco sobre isso? Por que tantas mudanças, especialmente no papel de vocalista, em um período tão curto?

DR: Bem, tivemos o Mike, depois o Wade [Black], e também o cara do Racer X [Jeff Martin] [N.E.: Dean esquece de mencionar Michael Thomas Beck e Chris Adams, falecido em 2011]. Mike não estava mais interessado em tocar metal, então precisamos encontrar alguém para concluir o "World Asylum" (2006). No entanto, depois que ouviu o álbum, ele decidiu voltar. Então fizemos o "New World Asylum" (2007). Mas chegamos a um ponto em que as visões divergiam. Embora considere Mike um excelente cantor de blues, eu buscava alguém que pudesse interpretar o metal, o heavy metal, alguém capaz de gritar e atingir notas elevadas. Quando recebi a oferta da Nuclear Blast para gravar um disco, não queria que fosse ele; queria algo com uma sonoridade mais voltada para o heavy metal. Não queria ficar no meio termo entre o glam rock e o heavy metal. Minha preferência é pelo puro heavy metal. Metal agressivo, com guitarras poderosas, e um vocalista que consiga incorporar essa essência.


MV: Você acredita que essas frequentes mudanças na formação podem criar uma percepção negativa por parte da mídia e do público em geral? Há uma facção saudosista que anseia, especialmente, pelo retorno de Mike. Como lidar com isso?

DR: Compreendo totalmente. Esses fãs são nostálgicos pelos primórdios da banda. No entanto, no final das contas, isso não vai acontecer. Eu simplesmente segui em frente, virei a página. O Leatherwolf com Mike e os outros membros originais não existe mais.



MV: Como o Leatherwolf consegue preservar sua identidade musical diante das mudanças na formação?

DR: Apesar de todas as alterações, o Geoff ainda é o principal compositor de muitas das músicas, o que contribui para mantermos uma essência semelhante à original. Geoff é um compositor de riffs fenomenal. Ninguém neste planeta escreve como ele e consegue tocar da forma como faz. Dito isso, posso adiantar que o próximo álbum será um pouco mais intrincado. Eu, pessoalmente, consigo compor músicas como "Nobody" e "Kill the Hunted", mas não tenho a mesma habilidade para criar peças mais progressivas, que demandam conhecimento teórico e talento técnico. Estou otimista de que funcionará. Na sua opinião, este álbum ["Kill the Hunted"] ainda captura a essência do Leatherwolf?


MV: Com certeza. O Leatherwolf do primeiro álbum. O verdadeiro heavy metal.

DR: Exatamente. Sempre almejei fazer parte de uma banda assim. No entanto, meio que suavizamos um pouco e adotamos certos elementos que nos colocaram em uma posição diferente; acusaram-nos de nos desviarmos do heavy metal e nos rotularam de glam rock.


MV: O estilo inicial do Leatherwolf foi fortemente influenciado pela New Wave of British Heavy Metal. Infelizmente, essas influências não eram tão populares nos Estados Unidos na época. A decisão de suavizar o som foi uma estratégia para garantir um contrato com uma gravadora, ou você diria que foi um desenvolvimento natural naquela época?

DR: Acredito que nunca foi algo planejado. Carey, Geoff e Mike estavam colaborando em algumas composições, e sinto que Geoff permitiu que os outros membros contribuíssem mais, resultando em algo um pouco mais simplificado e orientado para o mainstream. Pessoalmente, eu teria preferido manter um som mais pesado.


MV: Vocês finalmente conseguiram um contrato com a Island e lançaram os álbuns "Leatherwolf" (1987) e "Street Ready" (1989). Há algum momento ou faixa específica desses álbuns que você considera particularmente marcante para a história da banda?

DR: A história é o que é. Depois de gravar um disco, sigo em frente. A minha prioridade agora é "Kill the Hunted". Não costumo revisitar as músicas anteriores que gravei, e em algum momento, vou parar de ouvir até este álbum e começar a trabalhar em um novo projeto.



MV: Sendo assim, é correto afirmar que existem músicas do Leatherwolf que você não suporta mais tocar ao vivo?

DR: Não, porque eu escolho apenas as músicas que realmente gosto. Temos várias ótimas, como "Spiter", "Kill and Kill Again", "Season of the Witch", "Rise or Fall", "Gypsies and Thieves", "Spirits in the Wind", "Black Knight", "Thunder"... Quero dizer, estou meio farto de tocar "The Calling" ou "Hideaway". Não que sejam ruins, é só que prefiro apresentar algo um pouco mais complexo.


MV: Você talvez já tenha respondido a essa pergunta anteriormente, mas por que a banda tem dois álbuns autointitulados?

DR: Simplesmente não nos demos conta. Não pensamos nisso. Por mais bobo que pareça, essa é a pura verdade.


MV: Na sua opinião, como você percebe a evolução do cenário musical desde os primeiros dias da banda até os dias de hoje?

DR: Acredito que nunca mais veremos bandas icônicas como Iron Maiden, Judas Priest, Black Sabbath ou Deep Purple. Essas eram referências inigualáveis. Além disso, os shows ao vivo não gozam da mesma popularidade de antes.


MV: Como o Leatherwolf se posiciona nesse cenário musical em constante evolução?

DR: Não sei, sinceramente. Não faço a menor ideia. Não somos uma grande banda que sai em turnê todos os anos. Nosso projeto é mais intermitente. Veja bem, não lançamos um álbum desde quando? Desde 2007, certo? É desafiador reunir os membros certos a cada ano, como o Judas Priest faz, por exemplo. Eles conseguem fazer isso anualmente porque têm recursos financeiros, uma fonte de renda constante, vivendo da música. Nós não. Cada um de nós tem seus empregos convencionais.



MV: E qual é o seu emprego convencional?

DR: Sou empreiteiro, trabalho com instalação de telhados. Aliás, estava trabalhando em um agora. Acabei de chegar em casa para realizar esta entrevista.


MV: Quais são os desafios e oportunidades que a era digital e as plataformas de streaming trouxeram para o Leatherwolf?

DR: Parece que hoje em dia não há muita receita disponível, a menos que você seja uma grande banda em turnê, lucrando com shows e vendas de produtos. Ganhar dinheiro com a música, pelo menos para uma banda como a nossa, parece ser uma tarefa difícil.


MV: O que podemos antecipar da banda para o final deste ano e o próximo?

DR: Estamos em processo de regravar os maiores sucessos do Leatherwolf com os novos integrantes. Provavelmente, lançaremos o primeiro volume no próximo ano. Além disso, estamos trabalhando em outro álbum com músicas inéditas, na esperança de manter a mesma energia contagiante deste último. Superar isso vai ser um desafio!


MV: “Kill the Hunted” foi recentemente lançado em CD no Brasil. Para concluir, qual mensagem você gostaria de transmitir aos fãs brasileiros que estão interessados em adquiri-lo?

DR: Se você curte metal, certamente vai apreciar o álbum. Infelizmente, nunca tivemos a oportunidade de tocar no Brasil. Espero que esse lançamento nos abra algumas portas, porque ao vivo entregamos uma performance incrível!



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