ENTREVISTA: Marco Minnemann fala sobre o retorno do The Aristocrats ao Brasil e os bastidores da turnê de “Duck”

 


  • Entrevista também disponível em vídeo. Assista aqui.

O power trio The Aristocrats desembarca no Brasil para duas apresentações imperdíveis: dia 20 de agosto em Curitiba e 22 de agosto em São Paulo, trazendo na bagagem a turnê de seu mais recente álbum, “Duck” (2024). Formado pelo guitarrista Guthrie Govan, pelo baixista Bryan Beller e pelo baterista Marco Minnemann, o grupo é reconhecido pela impressionante técnica individual, pela química no palco e pela mistura única de rock progressivo, fusion e improviso.

Nesta entrevista exclusiva, Minnemann fala sobre a energia que o trio leva ao palco, a importância da improvisação e até os “acidentes felizes” que se transformam em momentos marcantes ao vivo. O bate-papo também traz histórias de suas passagens anteriores pelo Brasil, reflexões sobre a evolução da bateria nas últimas décadas, conselhos para músicos iniciantes e detalhes de seus próximos projetos, que incluem colaborações com artistas de peso da cena internacional.


Por Marcelo Vieira


The Aristocrats está prestes a se apresentar no Brasil mais uma vez. O que os fãs podem esperar dessa passagem pelo país?

Espero que até lá estejamos ainda mais entrosados como banda, porque já estamos em turnê com esse álbum há um bom tempo. E, com isso, aprendemos o que funciona melhor e em qual momento do set. Então, a expectativa é de entregar uma performance sólida. A gente ama os nossos fãs aí no Brasil — e já fazia um bom tempo desde a última vez com o The Aristocrats. Estamos muito animados. Pode esperar uma noite de amizade, conexão e, com sorte, uma experiência de show memorável para todos.


Como você descreveria a química musical entre você, o Guthrie e o Bryan?

Acho que temos algo quase telepático rolando entre a gente. A conexão é tão forte que já sabemos, instintivamente, como o outro vai tocar ou reagir. Isso aconteceu desde o começo, quando formamos o The Aristocrats. É raro ter esse tipo de química com outros músicos. Eu descreveria como uma conversa de olhos vendados: a gente quase consegue ouvir os pensamentos uns dos outros.


Essa química permite bastante espaço para improviso no palco. Podemos esperar essa vibe nos shows aqui no Brasil?

Com certeza. Embora cerca de 70% a 80% do repertório seja composto e estruturado, sempre há espaço para improvisação. Cada um de nós tem seus momentos para esticar os solos ou criar algo novo dentro das músicas. Às vezes, acontecem pequenas ideias mágicas no palco, e, se funcionam bem, incorporamos no show. Por isso, nenhum show do Aristocrats é exatamente igual ao outro.


E os famosos “acidentes felizes”? Também fazem parte da experiência?

Sempre! E a gente adora quando eles acontecem. Às vezes você fala ou toca algo no improviso e o público responde super bem — aí você traz aquilo de volta no show seguinte. Esses momentos são importantes. Se tudo fosse exatamente igual noite após noite, seria como ir ao mesmo restaurante todo dia. Os acidentes felizes são parte do charme. A gente abraça isso totalmente.


Como você lida com os imprevistos no palco?

Se o imprevisto for bom, ótimo, você lida de maneira tranquila. Agora, se for algo mais chato — como falha no PA ou queda de energia —, o jeito é parar, esperar a equipe resolver e tentar manter o bom humor. Costumo brincar com o público nesses momentos. É como na vida: imprevistos acontecem, o importante é manter a leveza, sempre que possível.


Falando do novo disco, “Duck”, como tem sido a recepção ao vivo até agora?

Muito boa. Acho que é um álbum forte. Quando levamos essas músicas para o palco, a resposta tem sido excelente. E com isso a gente aprende onde cada faixa se encaixa melhor no set — quais têm mais energia, quais são mais contemplativas. Isso ajuda a construir uma narrativa no show, algo com começo, meio e fim. Estamos bem felizes com o retorno do público.


Você já tocou no Brasil antes…

Muitas vezes! Com o The Aristocrats, acho que essa já é a terceira vez. E também fiz shows solo em São Paulo e no Rio de Janeiro — aliás, o Rio foi um dos primeiros. Já passei pelo país todo: Brasília, Porto Alegre, Belo Horizonte, Curitiba, Florianópolis… E também toquei aí com o Kreator, a banda de metal. Tenho boas lembranças dessas turnês.


Tem alguma história marcante dessas visitas?

Ah, várias! Também toquei aí com o Joe Satriani, por exemplo. O Brasil é sempre uma experiência incrível. Além da comida maravilhosa, o público é muito caloroso, receptivo. Sempre tem alguém querendo te mostrar um restaurante bacana, um lugar legal pra ir depois do show. É um lugar com espírito de rock and roll — e isso me conquista.




Você já tocou com artistas bem distintos — de Steven Wilson a Joe Satriani, passando pelo The Sea Within. O que você busca nessas parcerias musicais?

Na verdade, eu não busco muita coisa de forma planejada. Gosto de ver como é a química com os músicos e deixar as coisas acontecerem naturalmente. Não entro num projeto com a ideia fixa de que o álbum tem que soar de um jeito ou outro. Se a música é boa, ela é boa — independentemente do estilo. O que mais me atrai é estar cercado por músicos versáteis, com bom gosto musical e atitude. E se, além de tudo, forem boas pessoas… aí sim, é perfeito. Isso faz toda a diferença no dia a dia.


Como você consegue transitar por estilos tão diversos com tanta naturalidade?

Acho que é porque ouço muitos gêneros diferentes de música. Sou, antes de tudo, amante da música. E com a experiência — que pra mim é o melhor professor —, você aprende como se portar em cada situação. Aprende quando brilhar e quando simplesmente sustentar a música. Aprende o volume certo, quantas notas usar, qual a dinâmica ideal. São pequenos detalhes que você vai assimilando com o tempo. Depois disso, tudo vira uma conversa — uma conversa musical.


Como você enxerga a evolução da bateria no rock e no prog nas últimas duas décadas? O que mudou e o que continua essencial?

Muita coisa mudou — o que, aliás, é a essência da evolução. Primeiro, o equipamento melhorou bastante. Hoje a gente toca com instrumentos melhores, mais estáveis, e isso faz toda a diferença na performance ao vivo. Em termos de linguagem musical, também houve uma ampliação de horizontes. Na verdade, acho que contribuí um pouco para isso, ao lado do Terry Bozzio, lá atrás, quando começamos a explorar mais a independência na bateria.

Eu vinha de uma formação em órgão, tocava com duas mãos nos manuais, com acordes e melodias, e usava os pés para as oitavas no pedal. Aí pensei: “por que não aplicar isso na bateria?” E comecei a integrar múltiplos hi-hats, instrumentos controlados com os pés… Foi assim que aquele estilo se desenvolveu, e acredito que influenciou muita gente — o que me deixa muito orgulhoso.

Terry Bozzio, Gary Chester e eu fomos, de certa forma, pioneiros nisso nos anos 1980 e 1990. Depois veio uma geração inteira que também passou a explorar essas ideias.

Falando especificamente das duas últimas décadas, acho que o metal ficou ainda mais técnico. Isso tem muito a ver com o uso de tecnologia: muita coisa é programada, e isso exige dos músicos precisão milimétrica. Bateristas acabaram se adaptando a esse universo de clique e backing tracks. E tá tudo certo! Se o público curte e se identifica, então ótimo. Tudo é uma questão de gosto.


Você ainda dedica tempo para estudar e experimentar novas tecnologias ou está mais focado na composição e nas gravações?

Hoje eu sou mais voltado para composição. Toco guitarra também — aliás, tem uma aqui do meu colo agora, estava compondo quando começamos a conversar. Para mim, o que importa é a beleza da música, seja ela técnica ou uma balada suave. Se a ideia é boa e comunica algo, então vale a pena seguir em frente.

Sou um músico bem orgânico, mesmo curtindo elementos eletrônicos e bons sons digitais, que até uso nos meus trabalhos. Mas especialmente na bateria, gosto de deixar o instrumento soar, cantar. Gosto de tambores abertos, com som natural. Acho que é pra isso que eles foram feitos, sabe? Nesse ponto sou mais à moda antiga, mesmo tocando estilos modernos. Acredito que cada músico tem sua “voz” única, e isso se refina — ou se define — com o som que você tira do instrumento.


Muitos jovens te veem como referência e inspiração. Que conselho você daria para essa galera?

Poxa, obrigado! Nunca pensei muito nisso, mas se sou uma inspiração pra alguém, fico realmente feliz.
O que eu diria? Siga seu coração. Acredite no que você faz e não deixe ninguém te convencer do contrário. Se seus amigos, sua banda, as pessoas próximas gostam do que você está criando, continue. Nas redes sociais sempre vai ter alguém criticando, sempre vai ter um comentário negativo — é inevitável. Mas a maioria das pessoas está ali de boa, querendo apoiar. Então foque nas conexões reais, no que você acredita. Se você ama o que faz, há uma grande chance de outras pessoas também amarem. Siga seu caminho.


Com tantos shows, gravações e colaborações no currículo, o que ainda te desafia como músico?

Hoje, o maior desafio pra mim é a agenda, mais do que a música em si. Toco em muitos projetos de estúdio, já fiz várias turnês, mas tomei uma decisão consciente de focar no The Aristocrats. É uma banda consolidada, com público no mundo inteiro, e o melhor: tocamos nossas próprias músicas. Já tive anos em que toquei com o Steven Wilson, Joe Satriani e The Aristocrats — tudo no mesmo calendário! Cheguei a passar apenas dez dias em casa no ano. Em determinado momento, pensei: “espera aí, eu gosto do meu estúdio, gosto de estar em casa.” Tenho um estúdio portátil que levo nas viagens, mas estar em casa também é ótimo. Então fiz essa escolha de focar em poucas coisas que realmente fazem sentido pra mim.


Você pode adiantar algum projeto novo para os fãs?

Claro! Estou sempre compondo, e lanço minhas músicas novas pelo Bandcamp. Na verdade, já tenho um álbum praticamente pronto — só que, dessa vez, lancei faixa a faixa, em vez de lançar tudo junto. Além disso, estou trabalhando num disco com uma cantora incrível chamada Kotono, do Japão. Ela foi dançarina do Babymetal e vocalista da banda Koyai, que mistura prog, jazz e rock. Agora ela saiu do Koyai, tudo em bons termos, e começamos a colaborar. Também participam do projeto a violoncelista Mariko Muranaka, que já tocou com Madonna, Hans Zimmer e Andrea Bocelli — ou seja, nível altíssimo! E tem o David Pastorius, sobrinho do lendário Jaco Pastorius, além do Guthrie Govan, meu parceiro no The Aristocrats. Ele já gravou um solo pro disco. Vai ter muita gente legal envolvida. A primeira faixa deve sair nas próximas semanas, e o álbum completo vem alguns meses depois.


E pra fechar: se você pudesse escolher qualquer baterista — vivo ou não — pra dividir o palco num duo, quem seria e por quê?

Essa é difícil! São tantos… Mas o primeiro nome que me vem à cabeça é John Bonham. Pela pulsação, pelo som, pela técnica, pelo groove — tudo nele era incrível. Consigo me imaginar tocando com ele numa vibe bem legal, com grooves intensos e até alguns momentos mais técnicos. Seria incrível.




  • Ingressos para Curitiba aqui.
  • Ingressos para São Paulo aqui.


Comentários