ENTREVISTA: Tom G. Warrior fala sobre Celtic Frost, Setembro Negro e a conexão especial com o Brasil
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O Setembro Negro Festival 2025 traz um dos shows mais aguardados pelos fãs de metal extremo: o Triptykon apresentando um set especial de clássicos do Celtic Frost. À frente da banda, Tom G. Warrior — figura fundamental do heavy metal mundial e pioneiro do black e do death metal — retorna ao Brasil para celebrar sua história e revisitar composições que marcaram gerações. Nesta entrevista exclusiva, o músico falou sobre as expectativas para o festival, a escolha do repertório e o impacto de finalmente tocar um show completo dedicado ao Celtic Frost na América do Sul.
Ao longo do bate-papo, Tom também refletiu sobre sua trajetória artística, as dificuldades do início com o Hellhammer, a ousadia criativa do Celtic Frost, os aprendizados após erros dolorosos (“Cold Lake” incluso) e o processo de renovação que deu origem ao Triptykon. Com a mesma franqueza que o caracteriza, ele falou sobre legado, filosofia, liberdade artística, relação com o saudoso cofundador Martin Eric Ain, e até sobre o futuro da música e da humanidade. Um retrato profundo e honesto de um dos artistas mais influentes e inquietos do metal.
Por Marcelo Vieira
O Show e o Setlist
Oi, Tom, é um prazer tê-lo aqui. Para começar: o que o público brasileiro pode esperar deste show especial no Setembro Negro, focado no repertório do Celtic Frost?
Por que todo mundo me faz essa pergunta? Estou na cena há 44 anos. Já não sabem o que esperar? [Risos.] As pessoas sabem quem eu sou, o que defendo, o que faço no palco. E eu já toquei no Brasil várias vezes. Então é uma pergunta estranha para mim. O que eles podem esperar? Bem, eu sou músico. Portanto, esperem música!
Houve algum critério específico na seleção do repertório para esta turnê?
O critério é que realmente gostamos de tocar no Brasil. E não digo isso apenas por estar agora na Índia, no Chile, na Argentina e em outros países da América do Sul. Também pela combinação de Triumph of Death e Triptykon. Nunca tive a chance de tocar um set completo do Celtic Frost na América do Sul. Da última vez, fizemos uma turnê que incluiu Chile, Brasil e outros países, mas o repertório era misto, Triptykon e Celtic Frost. Desta vez, temos a oportunidade de tocar mais músicas clássicas, como o promoter pediu. Sentimo-nos muito honrados por sermos convidados a voltar várias vezes nos últimos anos, especialmente considerando que o Celtic Frost, que foi minha banda principal por grande parte da minha vida, nunca conseguiu tocar na América do Sul. Tentamos várias vezes e, por algum motivo, não deu certo. A primeira vez que toquei aí foi com o Triptykon [em 2018] e, depois, também com o Triumph of Death [em 2023], tocando músicas do Hellhammer. Agora estamos de volta com essas duas bandas. A recepção calorosa do público nos faz sentir muito bem-vindos.
Muitos músicos dizem que tocar músicas antigas é como revisitar fantasmas do passado. Você sente isso?
Mais uma vez, preciso me referir ao público. Depende muito dele. Se as pessoas também têm interesse nas músicas antigas — thrash metal clássico, proto-black metal —, então não parecem fantasmas. Parece tudo muito vivo, muito atual. Claro, são composições de quase 40 anos atrás, mas, até agora, tivemos sorte. A reação do público, sobretudo na América do Sul, é como se fossem músicas novas. Não sei bem o motivo, mas fico extremamente feliz. Do palco, vemos uma plateia diversificada: jovens, veteranos, pessoas da minha geração. E a resposta é sempre como se estivéssemos apresentando um novo álbum. Acho que essa é uma pergunta que precisa ser feita ao público.
Quais lembranças mais marcantes você guarda de se apresentar aqui no Brasil e de se conectar com o público brasileiro?
Vindo da Suíça, senti que o público no Brasil era extremamente enérgico e entusiasmado. Na Suíça, as pessoas são mais frias, contidas, conservadoras — faz parte da nossa cultura. Mas na América do Sul, e especialmente no Brasil, o público é mais caloroso, mais receptivo, muito mais intenso. Não têm medo de demonstrar entusiasmo, de suar, de bater cabeça, de se entregar completamente à música. Essa é a principal diferença que percebo.
Há planos de lançar um álbum ao vivo com músicas do Celtic Frost, nos moldes do “Triumph of Death Live”?
Sim. Temos várias gravações do Triptykon tocando tributos ao Celtic Frost. Muitos festivais já nos pediram isso e, até agora, fizemos talvez dez apresentações nesse formato. Gravamos boa parte delas. Mas o Triptykon é, antes de tudo, o Triptykon, e acreditamos ser mais importante lançar um novo álbum de estúdio, já que somos uma banda ativa. O [show] Celtic Frost Legacy é apenas parte da nossa identidade. Assim que finalizarmos esse novo álbum de estúdio em que estamos trabalhando, vamos discutir o lançamento de parte desse material gravado. Temos alguns shows favoritos registrados, que ainda vamos revisar e mixar. Talvez, no futuro, lancemos um álbum ao vivo. Mas, neste momento, nossa prioridade é o próximo disco do Triptykon.
Início e Primeiras Dificuldades
Você se lembra da primeira vez em que percebeu que queria dedicar sua vida à música?
Provavelmente foi quando eu era um adolescente. Cresci cercado por música, e ela foi muito importante para mim por causa das circunstâncias difíceis da minha juventude. A música se tornou uma forma de escape, um refúgio. Com o tempo, isso despertou em mim o desejo de tocar. Passei a compreender melhor como tudo funcionava — que era preciso ir a um estúdio, comprar instrumentos. Ainda adolescente, comecei a entender como a cena musical operava. Lia muitas revistas especializadas e mergulhava na coleção de discos da minha mãe, que era bastante variada — ia do jazz ao rock. Eu ouvia tudo aquilo e sentia cada vez mais vontade de tocar um instrumento. Primeiro quis ser baterista, mas não tínhamos dinheiro para uma bateria. Então comecei a olhar para o baixo. Foi assim que tudo começou.
Você costuma mencionar que o Hellhammer foi duramente criticado e que ninguém queria apoiá-los na época. Como você lidava emocionalmente com essa rejeição?
Foi um misto para nós. Por um lado, dizíamos: “Não nos importamos, acreditamos no Hellhammer e no que estamos fazendo.” Sentíamos que havíamos criado nosso próprio pequeno mundo e não ligávamos para o que os outros pensavam de fora. Por outro, claro que era difícil lidar com isso. Afinal, éramos seres humanos, jovens e cheios de sentimentos como qualquer pessoa. Às vezes era complicado, mas aprendemos a enfrentar, absorver e tirar lições dessas experiências.
Olhando para trás, você sente que essa falta de apoio acabou impulsionando sua evolução como artista?
Sem dúvida. Isso nos tornou mais radicais, mais determinados. Queríamos mostrar ao mundo que nossa música tinha valor. E também queríamos provar que poderíamos melhorar. Sabíamos que não éramos perfeitos, mas trabalhávamos fanaticamente para evoluir como banda.
Hoje, muitos músicos de diferentes gêneros citam o Hellhammer como influência. Algum nome em especial já te surpreendeu ao dizer isso?
Essa é uma pergunta difícil. Procuro não pensar muito nisso. Seria arrogante andar por aí dizendo: “Vejam só, eu sou um músico influente!” Não é assim que eu funciono. O que me importa é a música. Sou muito grato às pessoas que ouvem o que faço e que me permitem continuar sendo músico. Estar aqui, mais de 40 anos depois, ainda vivendo disso, é um presente. O fato de poder tocar em todo o mundo, inclusive na América do Sul, não é algo que eu jamais teria dado como certo. Quando adolescente, era apenas um sonho distante — e foram as pessoas que o tornaram possível. Então, acima de tudo, o que sinto é gratidão.
Celtic Frost e Inovação
O Celtic Frost rapidamente se destacou por sua ousadia ao incluir instrumentos de corda, teclados e vocais femininos. De onde veio essa vontade de quebrar barreiras?
É muito simples: era a música que ouvíamos, a música que Martin Eric Ain ouvia. Éramos apaixonados por heavy metal, claro, mas também escutávamos jazz, música clássica e new wave na época. Gostávamos muito disso e não entendíamos por que diziam que não podíamos combinar esses estilos com peso. Tínhamos curiosidade em experimentar — como soariam elementos da new wave em músicas pesadas? Ou como instrumentos clássicos poderiam soar ao lado de guitarras distorcidas? Se você olhar para bandas que vieram antes de nós, como o Emerson, Lake & Palmer, por exemplo, eles usavam instrumentos clássicos e soava fantástico. O mesmo valia para o rock dos anos 1970, do qual eu era grande fã: ali já existiam muitas fusões entre new wave, rock e guitarras pesadas. Então pensamos: por que não testar isso em nosso som, ainda mais pesado? Não entendíamos por que não poderíamos fazer isso.
Na época, vocês tinham a sensação de estar criando algo à frente do tempo de vocês?
Não, de forma alguma. Para nós, era apenas a música que amávamos. Não percebíamos que estávamos fazendo algo novo. Só começamos a entender isso quando a mídia começou a escrever a respeito, quando fãs nos abordavam ou quando revistas como a Kerrang! diziam: “Isso soa como algo inédito. Essa combinação nunca foi feita antes.” Foi aí que caiu a ficha. Mas, para nós, tudo sempre foi muito pessoal. Era simplesmente a música pela qual éramos apaixonados, feita a partir das nossas influências. Queríamos criar o mesmo tipo de impacto que os artistas que admirávamos tiveram em nós.
Como você enxerga a relação entre música e artes visuais no seu trabalho?
Sempre foi fundamental. Martin e eu acreditávamos que o aspecto visual era um presente, uma forma de se expressar em outro nível, além do som. A arte pode ser sonora, pode ser visual, e nós sentíamos que o lado visual era tão criativo e poderoso quanto a música.
Quais são as suas memórias mais marcantes do processo de criação com Martin?
Acho que ambos éramos pessoas fortes, cheias de ideias, mas muito diferentes entre si. Isso tornava o processo criativo complexo, mas também incrivelmente interessante. Aprendi muito com as ideias do Martin, que às vezes pareciam estranhas para mim, e acredito que ele também aprendeu com as minhas, que por vezes lhe soavam estranhas. O resultado foi que crescemos como pessoas e como artistas, expostos a perspectivas que, de outro modo, talvez nunca tivéssemos considerado. Mesmo com divergências — e eram muitas — sempre conseguíamos transformar o atrito em algo criativo. Lembro que, na última vez em que me encontrei com Martin, duas semanas antes de sua morte, conversamos justamente sobre isso: sim, discutíamos bastante sobre qual direção seguir em uma música, mas no fim sentíamos que havíamos criado algo novo. Os conflitos sempre acabavam gerando arte.
Sabe-se hoje que o Nirvana ouvia “To Mega Therion” (1985) em sua van antes de gravar “Nevermind” (1991). Qual foi sua impressão da banda quando a escutou pela primeira vez?
Na época, o Nirvana soava muito novo para mim, e precisei de algumas audições para começar a entendê-los. Mas percebi que eles também estavam tentando criar algo diferente. O heavy metal, no fim dos anos 1980 e início dos 1990, já estava exausto, decadente — e nisso incluo o próprio Celtic Frost. Os excessos do hair metal, a influência hollywoodiana, tudo isso havia tornado a cena muito artificial. Então o Nirvana surgiu e varreu esse cenário. Eles mostraram que o verdadeiro rock precisava nascer em uma garagem, não em mansões de milionários com laquê no cabelo. Foi revigorante, mas também um choque, porque o Celtic Frost também tinha caído nessa decadência. O Nirvana trouxe de volta a essência do rock e, para mim, foi um verdadeiro chamado para despertar.
Controvérsias e Lições
Falando em decadência, “Cold Lake” (1988) ainda é visto como o “patinho feio” na sua discografia. Que lições esse disco lhe trouxe como músico e como pessoa?
Bem, na minha opinião, foi um álbum catastrófico — e eu assumo responsabilidade por isso, o que foi muito difícil na época. Mas, por outro lado, devo dizer que fomos extremamente honestos conosco mesmos quando percebemos o que havíamos criado. Acho que todos nós tivemos essa postura, e, no meu caso, senti que devia a mim mesmo ser sincero e realmente analisar o disco, em vez de simplesmente dizer: “Sim, é um bom álbum porque eu o fiz”. Precisei admitir para mim mesmo que não, não era um bom álbum. Isso me obrigou a amadurecer como músico, a evoluir artisticamente. Também me levou a olhar para frente e me questionar: por que isso aconteceu? O que há de errado nesse trabalho? O que há de bom? O que devo evitar no futuro? Meu controle de qualidade é suficiente ou preciso ser muito mais rigoroso quando gravo um álbum?
Percebi ainda que havia cedido controle demais a outros músicos ou ao produtor. Jurei a mim mesmo que isso nunca mais aconteceria, porque, no fim das contas, é o meu nome que está no álbum. Eu carrego a responsabilidade, e é a mim que as pessoas vão associar o resultado, não importa quem mais esteja envolvido. Meu nome está ali e eu preciso defender a qualidade. Portanto, acredito que “Cold Lake” me fez crescer não apenas como músico, mas também como indivíduo. E espero que, desde então, eu nunca mais tenha lançado outro álbum como “Cold Lake”.
Mesmo sabendo que há demanda dos fãs, por que você é tão resistente à ideia de relançar “Cold Lake”?
Porque seria um desperdício de matéria-prima — e já desperdiçamos recursos demais neste planeta. A simples fabricação de CDs, por exemplo, consome petróleo e gera poluição. Para mim, seria um gasto inútil. Além disso, não possuo os direitos de “Cold Lake”. O material inicial do Celtic Frost pertence à gravadora, e atualmente os direitos estão com a BMG, em Londres. Se a BMG um dia decidir relançá-lo, não terei como impedir. Tenho certeza de que isso vai acontecer, no máximo, quando eu morrer. Porque aí vão pensar: “Agora que o Tom está nas manchetes, vamos lançar tudo o que temos para ganhar algum dinheiro”.
Até hoje, eles respeitaram meu pedido de não relançar o álbum. Mas, cedo ou tarde, tenho certeza de que o farão, porque os direitos são deles. É simplesmente a realidade do mercado, não é?
A Vida Além da Música
Houve períodos em que você se afastou da música e trabalhou em empregos regulares. Que perspectiva esses tempos mais “anônimos” lhe trouxeram?
Bem, eu saí do Celtic Frost depois que a banda se dissolveu pela primeira vez, no início de 1993. Eu estava muito frustrado, de certa forma, com a indústria fonográfica dos anos 1980, que roubava dinheiro e interferia em tudo: na música, na composição, no repertório dos álbuns, nas capas. Basicamente, as gravadoras se metiam em cada aspecto do que uma banda queria fazer e, no fim, ainda ficavam com o dinheiro. Depois de anos lidando com isso no Celtic Frost, eu estava esgotado.
Então, vendi todo o meu equipamento, tentei levar uma vida “normal” e arrumei um emprego comum. Mas ir a shows se tornou doloroso. Ver outras bandas no palco era quase insuportável, e comecei a evitar concertos justamente por isso. Até que percebi: “não, preciso tentar de novo”. Eu tinha que voltar a ser músico, não aguentava mais ficar de fora. Lembro que minha ex-mulher me levou a um show do Queensrÿche — eles foram fenomenais — e aquilo me doeu profundamente. Foi ali que decidi, em meados dos anos 1990, que tentaria novamente.
A grande diferença foi que, dessa vez, eu tinha minha própria gravadora e descobri que também podia ter minha própria editora. Isso me deu controle total sobre tudo o que fazia — e foi a melhor decisão da minha vida. Essas empresas existem até hoje, e tudo o que produzi desde então, incluindo o álbum de reunião do Celtic Frost [“Monotheist” (2006)] e todos os discos do Triptykon, saiu pelo meu próprio selo, em parceria com outras gravadoras. A lição foi clara: ter controle total sobre meu trabalho é fundamental.
O retorno com “Monotheist” foi amplamente aclamado. Como foi para você vivenciar um renascimento tão criativo depois de tantos anos de silêncio?
Martin e eu sentíamos que o Celtic Frost ainda não tinha realmente terminado, que ainda não havia dito tudo o que precisava dizer. Isso se devia, em grande parte, às interferências das gravadoras. Além disso, nos incomodava o fato de que um dos últimos registros da banda tivesse sido “Cold Lake”. Queríamos fazer uma declaração — uma declaração forte e definitiva.
Por isso, quando reformamos o Celtic Frost, em 2001, não tivemos pressa de entrar em estúdio. Decidimos trabalhar com calma. Escrevemos dezenas de músicas, fizemos inúmeras demos, até que chegamos ao ponto em que sentimos que tínhamos material sólido. Esse processo levou cinco anos e meio. Mas, no final, conseguimos reunir as melhores composições e lançar “Monotheist”.
Estamos muito felizes por não termos cedido à pressa. Não queríamos um álbum feito às pressas, mas um disco que realmente fizesse sentido para nós. Cada música tinha que estar no lugar certo. É por isso que “Monotheist” soa do jeito que soa.
O Triptykon nasceu logo após o fim definitivo do Celtic Frost. Você o enxerga como uma continuação espiritual daquela era ou como um novo começo?
Vejo muito mais como uma continuação do Celtic Frost. Eu não deixei a banda por motivos musicais. Pelo contrário, estava extremamente satisfeito com a música que fazíamos naquele momento. Saí por motivos pessoais, porque havia certas pessoas dentro do Celtic Frost que colocavam o ego acima da música.
Quando formei o Triptykon, convidei o último guitarrista do Celtic Frost, V. Santura, para integrar a banda. Eu sabia que ele não tinha problemas de ego — era um músico fenomenal, apaixonado por criar música, assim como eu. E nós dois tínhamos clareza: queríamos continuar a desenvolver o que o Celtic Frost havia começado, mas deixando para trás todos os problemas de ego e vaidade. O foco era — e sempre será — a música.
Legado e Filosofia
Você é frequentemente citado como uma influência central tanto no black metal quanto no death metal. Você ainda se surpreende com a longevidade desse legado?
Com certeza. Ainda me soa muito estranho. Conheço meus limites como músico e me considero alguém bastante mediano. Não é falsa modéstia, é realmente como me vejo. Ainda estou crescendo, ainda estou aprendendo. E há músicos por aí — bandas como Yes ou Opeth — que eu escuto e penso: “Nossa, como conseguem ser tão bons?”. Eu simplesmente não sei como chegar a esse nível. Eles me inspiram, especialmente Mikael Åkerfeldt, do Opeth, que considero um gênio absoluto. Gostaria de ser tão bom quanto ele, mas sei que nunca alcançarei esse patamar. Por isso, enxergo meu próprio trabalho com muito mais humildade.
Agora mesmo, enquanto converso com vocês, estou a apenas três quilômetros do local onde ficava a sala de ensaio do Hellhammer há mais de 40 anos. Ou seja, ainda me sinto profundamente conectado ao jovem Tom, que estava começando a aprender guitarra, nota por nota, sozinho. Aquilo foi uma luta enorme para mim — e ainda é. Nunca parei de tentar aprender a tocar, de tentar evoluir como compositor. Escrever uma música continua sendo uma montanha a escalar. Não tenho um segredo, nenhuma fórmula mágica para isso. Por isso me vejo de maneira realista: como um músico comum. E é justamente por isso que fico tão feliz cada vez que termino uma música, porque sei o tamanho do desafio. Quando alguém me chama de influência, isso realmente me impressiona, porque eu não me enxergo assim.
Como você lida com o rótulo de “pioneiro” de gêneros tão extremos, considerando que nunca quis se limitar a rótulos?
É uma honra, sem dúvida. Mas, como acabei de dizer, para mim é muito estranho ouvir isso. Ainda acho que tenho muito a melhorar, muito a aprender. Também sei que, ao longo da minha carreira, cometi muitos erros — musicalmente e em outros aspectos. Então, claro, me sinto lisonjeado, grato e honrado quando as pessoas falam isso. Mas, pessoalmente, sou muito mais crítico comigo mesmo. Me vejo em um nível muito mais baixo.
Por que você acha tão importante enfatizar que “só a morte é real”? O que esperava evocar naqueles que lessem a frase “only death is real” impressa em seus álbuns?
Basta olhar para a história da humanidade. Veja o que fizemos nos últimos, digamos, 15 mil anos. Sabemos que existem coisas positivas neste planeta: amor, arte, música, ciência. Mas em que a humanidade realmente se destaca? Em matar uns aos outros. Em travar guerras, em mentir, enganar, manipular — por poder, dinheiro, controle. Infelizmente, acho que essa é a verdadeira natureza humana.
E, no fim das contas, o que isso nos traz? Nada. Todos morrerão. Tudo neste planeta morrerá. Até uma pedra, com o tempo, será reduzida a pó. A morte é a única realidade universal de tudo o que existe aqui. Até mesmo este planeta morrerá. Nosso sol, inevitavelmente, também. Quer queiramos ou não, essa é a realidade esmagadora — em pequena escala, para os seres humanos, e em grande escala, para o universo inteiro.
Liberdade Artística, Projetos Futuros e Reflexões
Você já pensou em gravar algo completamente fora do metal, como um álbum experimental ou acústico?
Sim, claro, de vez em quando penso nisso. Mas, por outro lado, estar em uma banda como o Celtic Frost ou o Triptykon já me dá a liberdade de fazer praticamente o que eu quiser. Nessas bandas, explorei elementos de jazz, música eletrônica, música clássica, experimentação sonora e até o uso de samples. Sou muito afortunado por ter feito parte de grupos tão abertos artisticamente. É claro que, às vezes, passa pela cabeça a ideia de gravar um álbum solo ou colaborar com outros músicos — o que, de vez em quando, já aconteceu. Mas, no geral, dentro da minha própria banda, não sinto limitações. Nunca me sinto preso a um formato.
Há algum artista ou banda contemporânea com quem você gostaria de trabalhar no futuro?
Existem muitos artistas que admiro profundamente, mas não sei se sou bom o bastante para colaborar com eles — e digo isso com total sinceridade. Já houve pessoas que respeito muito que me convidaram, por exemplo, para subir ao palco ao lado delas. Quando respondi que não me achava bom o suficiente, foi por realismo, não por falsa modéstia.
Depois de tantos anos na música, qual você diria que foi o ponto mais alto da sua carreira?
Recentemente me fizeram essa mesma pergunta em outra entrevista, e precisei refletir bastante. No fim, percebi que o momento mais importante dos meus 44 anos de carreira foi quando conheci Martin Eric Ain. Esse encontro mudou completamente a minha vida — e, é claro, mudou a dele também. Sem essa parceria, meu caminho teria sido muito diferente. Aprendemos muito um com o outro e criamos músicas absolutamente únicas juntos. Para mim, esse foi o ponto mais alto, muito acima de qualquer outro marco que tenha vivido depois.
O Brasil sempre recebeu você e suas bandas com grande entusiasmo. Que mensagem gostaria de deixar para os fãs antes desse show especial?
É absolutamente verdade: o Brasil sempre foi um lugar especial para mim. A última vez que toquei aí foi com o Triumph of Death, também no Setembro Negro Festival. Sou imensamente grato ao público que tornou isso possível e que agora está nos trazendo de volta à América do Sul. Para alguém que veio de uma pequena vila na Suíça — especialmente nos anos 1980, quando quase não havia músicos suíços alcançando relevância internacional —, jamais passaria pela minha cabeça que um dia estaria tocando no outro lado do oceano, em um continente diferente. Ser convidado para isso é uma honra que nunca tomo como algo garantido. Por isso, sempre tento demonstrar minha gratidão no palco, trocando energia e adrenalina com o público. É, sem dúvida, uma honra imensa.
O Setembro Negro 2025 ocorre nos dias 5, 6 e 7 de setembro no Vip Station, em São Paulo. O Triptykon encerra o festival. Ingressos à venda no site Clube do Ingresso.








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